Por que especialistas em educação condenam adoção de material didático 100% digital

A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo anunciou que adotaria, a partir do ano letivo de 2024, materiais 100% digitais para os alunos dos anos finais do ensino fundamental (6º ao 9º ano) e do ensino médio. O governo paulista, depois, recuou e prometeu oferecer livros em formato digital e também em papel.

Em entrevista a Natuza Nery, o pesquisador em educação e tecnologia na Universidade de Nova York Fabio Campos argumenta que substituir a experiência de ensino analógica por uma completamente digital “não é o caminho” e defende que as duas ferramentas atuem de maneira complementar.

“Dentro de uma experiência de aprendizagem que eu quero que seja fantástica, memorável para o aluno, onde é que entra o analógico? Onde é que entra o ser humano? Onde é que entra o vídeo gravado? Onde é que entra o livro digital?”, questiona Campos, que também é pesquisador do TLTL – Transformative Learning Technologies Lab, da Universidade de Columbia.

Ele alerta ainda que para as consequências de uma estratégia falha na transição entre o analógico e o digital.

“Uma consequência horrível disso é alguém dizer o seguinte: ‘Não quero mais usar o digital’. A gente demoniza o digital, dá alguns passos atrás e fica pior do ponto do que a gente começou.”

Imagem ilustrativa mostra mãos de aluno segurando celular e caneta — Foto: Reprodução/TV Gazeta

Para Anna Helena Altenfelder, doutora em psicologia da educação e presidente do conselho do Cenpec, “o meio digital é um meio que favorece a dispersão”.

“Quando nós estamos lendo no meio digital, nós temos múltiplas informações. Então, ele vai desenvolvendo, pode desenvolver, um comportamento leitor de uma leitura mais superficial, ter a leitura interrompida para ler outra coisa, para se comunicar com alguém na rede social.”

Ela também explica como a concentração pode ser prejudicada só com telas.

“Enfim, quando a gente está lendo na tela, muitas vezes nós temos vários estímulos e mudamos de um texto para outro, de uma tarefa para outra com muita facilidade. O meio digital possibilita isso. Então isso traz um prejuízo para a concentração.”