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Por que só agora o segundo esporte mais popular do mundo estará nos Jogos Olímpicos

O Comitê Olímpico Internacional oficializou nesta segunda a inclusão de cinco modalidades aos Jogos Olímpicos de 2028 em Los Angeles. As notícias dão a lista como algo quase trivial: beisebolsoftbol, flag football, críquete, lacrosse e squash. Alguns esportes fortes nos Estados Unidos, alguns outros que o brasileiro médio não está muito acostumado e fica por aí. Nada que soa impactante, mas essa é uma percepção absolutamente errada.

Quatro das modalidades brigam há muito tempo por uma chance de entrar no programa olímpico. O beisebol-softbol entrou e saiu algumas vezes, e tenta convencer o COI que merece um espaço permanente. Mas, com o críquete, foi o contrário.

O Comitê que sonhava há muito tempo em incluir o esporte, e muitas vezes era desdenhado. Mas o esforço valia a pena para poder impulsionar o evento com a segunda modalidade mais popular do planeta.

Esqueça a imagem estereotipada que se criou em cima do críquete, de um esporte com cara de nobreza inglesa cujas partidas demoram cinco dias, as pessoas assistem tomando chá e ninguém entende as regras direito. Nada mais falso.

O críquete se expandiu para além da Inglaterra há séculos, foi ganhando uma personalidade própria em cada lugar e explodiu em popularidade. Ainda há partidas de cinco dias, mas o formato que atrai mais torcedores e dinheiro, o Twenty20, dura pouco mais de três horas.

“Nós estamos ansiosos para receber o segundo esporte mais popular do mundo, com uma estimativa de 2,5 bilhões de fãs pelo mundo”, disse Niccolo Campriani, diretor do Comitê Organizador Local de Los Angeles, antes da votação que aprovou a entrada das novas modalidades. A afirmação de que se trata da segunda modalidade mais popular do mundo gera debate, pois o basquete tem muitos seguidores que não aparecem em pesquisas por apontarem outro – normalmente futebol ou futebol americano – como modalidade preferida em uma pesquisa. O que não significa que essas pessoas não consumam basquete.

De qualquer maneira, o críquete tem seus argumentos nessa discussão. O esporte é, de longe, o mais popular em países como Índia, Paquistão, Sri Lanka e Bangladesh. Além disso, é o segundo ou terceiro mais popular em Austrália, Nova Zelândia, África do Sul, Inglaterra, Emirados Árabes, Zimbábue, Trinidad e Tobago, Jamaica e Guiana, e vai ganhando espaço no Oriente Médio, na Ásia Central e, impulsionado pela comunidade indiana, nos Estados Unidos.

O quanto essas pessoas todas acompanham e consomem o esporte? A Indian Premier League é uma das ligas que mais crescem no mundo, com média de público de 32,8 mil por jogo.

Apenas NFL, Premier League, Bundesliga e AFL (liga de futebol australiano) têm números melhores. A final da IPL de 2022 reuniu 101.566 torcedores no estádio Narendra Modi, em Ahmedabad.

Se a medição for pela entrada do esporte nas redes sociais, o críquete também impressiona. Virat Kohli, estrela indiana e talvez o melhor jogador do mundo, tem praticamente o mesmo número de seguidores no Instagram (260 milhões) que LeBron James, Tom Brady, Stephen Curry, Patrick Mahomes, Roger Federer e Serena Williams somados (262,4 milhões). Cristiano Ronaldo (608 milhões) e Lionel Messi (489 milhões) são os únicos atletas no mundo com mais seguidores que Kohli.

É muita gente, e o COI queria fazer que todas elas tivessem mais motivos para acompanhar as Olimpíadas com mais atenção. Sobretudo na Índia, país mais populoso do mundo (por estimativas das Nações Unidas, ultrapassou a China em abril deste ano) e com uma economia que cresce rapidamente.

Os Jogos ainda não emplacaram no Sul da Ásia, com países cuja tradição poliesportiva não acompanha a população e o potencial de mercado. Mesmo no hóquei na grama, em que indianos e paquistaneses dominaram por algumas décadas, a região já ficou para trás.

Os Estados Unidos também estão de olho nesse mercado. Neste ano, foi criada a Major League Cricket, primeira liga profissional da modalidade na América do Norte. Além disso, os norte-americanos organizarão, ao lado das Índias Ocidentais (no críquete, as ilhas inglesas do Caribe formam uma seleção única), a Copa do Mundo de T20 em 2024.

O esporte está em acelerada expansão, e até por isso dava de ombros aos flertes do COI para entrar nos Jogos Olímpicos. O ICC (Conselho Internacional de Críquete) organiza um grande torneio por ano: a Copa do Mundo de Test Match (jogo de cinco dias), a Copa do Mundo de ODI (jogos de um dia), a Copa do Mundo de T20 e o Champions Trophy se revezam. Ainda há a versão feminina de todas essas competições, com exceção do Mundial de Test.

Durante muito tempo, a entidade considerava que o calendário já estava bem ocupado, e não fazia sentido extinguir ou ofuscar um de seus torneios – em que ela organiza e fatura com direitos de TV, patrocínios e ingressos – para realizar um em que o COI teria os ganhos.

O crescimento da modalidade, porém, chegou a um ponto em que entrar nos Jogos Olímpicos se tornou estratégico. O ICC é dominado pelos dirigentes de Índia, Inglaterra e Austrália, que por muito tempo pensavam pioritariamente na realidade de seus países. No entanto, estar nas Olimpíadas é fundamental para fomentar o críquete em nações ainda iniciantes, pois o “sim” do COI também significa que as federações nacionais receberão repasse de verba de seus comitês olímpicos e poderão investir no desenvolvimento de suas equipes.

É o caso do Brasil, que tem um projeto forte em Poços de Caldas-MG e já montou seleções para disputar partidas internacionais. Neste fim de semana, a seleção masculina sub-19 foi bicampeã sul-americana. Em setembro, a seleção feminina foi terceira colocada nas Eliminatórias das Américas para a Copa do Mundo T20, atrás apenas de Estados Unidos e Canadá.

Resultados significativos para uma modalidade que ainda é tão incipiente aqui. A partir de agora, com a entrada do críquete nos Jogos Olímpicos, a tendência é que se aumente a capacidade de investimento. Até porque vai ficar cada vez mais difícil o público ignorar a existência do esporte que pode ser considerado o segundo mais popular do mundo.

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